segunda-feira, 23 de maio de 2011

A hipocrisia é humana

É muito difícil aceitar a falsidade, o esconde-esconde e o disfarce nas condutas das pessoas. Quem de nós já não experimentou atitudes dessa natureza em outras pessoas? É digno de indagação saber por que temos atitudes assim. Nascemos assim ou aprendemos com os outros? Essa é uma discussão que nos leva a refletir sobre o nosso caráter. Se assim é, devemos nos questionar sobre qual a possibilidade de ultrapassar esse tipo de comportamento. Não sabemos por onde começar.
Aristóteles nos ensina que somos formados de humores. A alegria, a tristeza, a indiferença e a melancolia são como que fluídos que percorrem o nosso corpo, repercutindo no nosso espírito.   As nossas ações e escolhas resultariam de um processo de equilíbrio entre esses humores. As paixões humanas e o nosso jeito de ser e de construir a nossa existência também são construídos a partir das nossas sensações e não vêm de uma instância transcendental. Isso significa que o homem  está diante de um mundo onde os valores e o sentido da vida parece que desapareceram. Todavia, ele tem a possibilidade de edificar situações agradáveis para se viver.
Neste sentido, podemos considerar inteligente o ser humano que em vez de desprezar este ou aquele semelhante é capaz de o examinar com olhar penetrante, de lhe sondar por assim dizer a alma e descobrir o que se encontra em todos os seus desvãos.
Sabemos que tudo no homem e no mundo se transforma com grande rapidez; num abrir e fechar de olhos, um terrível verme pode corroer-lhe as entranhas e devorar-lhe toda a sua substância vital, como dissera o escritor Nicolau Gogol. E tudo isso tem a ver com as paixões que nos constitui. Muitas vezes uma paixão, grande ou mesquinha pouco importa, nasce e cresce num indivíduo para melhor sorte, obrigando-o a esquecer os mais sagrados deveres, a procurar em ínfimas bagatelas a grandeza e a santidade. As paixões humanas não têm conta, são tantas, tantas, como as areias do mar, e todas, as mais vis como as mais nobres, começam por ser escravas do homem para depois o tiranizarem.
Está plena de sorte aquela pessoa que, possuída de paixões, sabe e tem a paciência de escolher a mais nobre e, com isso, garantir o aumento de sua felicidade de hora a hora, de minuto a minuto,penetrando mais e mais no ilimitado paraíso da sua alma. Tarefa difícil? Sim. Existem paixões cuja escolha não depende do homem: nascem com ele e não há força bastante para as repelir. Uma vontade superior as dirige, dotando-as de um poder de sedução que dura toda a vida, mas que podem contribuir misteriosamente para o bem do homem. No entanto, muitas vezes agimos em sentido contrário, mesmo conhecendo o que é o melhor. Ser hipócrita é uma dessas atitudes. Fingimento e simulação, expressões da hipocrisia, mostra o nosso caráter finito, incompleto e aberto.
            Nós somos dotados de carne, de osso e de hipocrisia, isto é, de uma característica intrínseca que denota impostura de virtudes e sentimentos onde não enxergamos em nós mesmos, mas percebemos de forma abundante em outrem. Somos bons juízes dos outros, mas temos dificuldades em nos olhar. Será vergonha? Sem pretender dar nenhuma lição de moral, fazer esse giro para dentro de nós mesmos é um desafio que nos atinge e nos provoca e que pode nos levar a um autoconhecimento e abrir a possibilidade de pelo menos não mentir para os outros e nem a si mesmo. É possível isso? Otimista, sim, iludido, não, mas é um bom exercício para darmos um sentido agradável à nossa existência. À tarefa!

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